quarta-feira, 20 de julho de 2016

O dízimos e as contribuições no Novo Testamento




É verdade que o Novo Testamento não apresenta diretrizes claras sobre a prática da entrega do dízimo pelos cristãos e esse fator é, no mínimo, surpreendente. Como afirma Hawthorne, “já que o dízimo desempenhou um papel tão importante no AT e no judaísmo contemporâneo do cristianismo primitivo. É surpreendente descobrir que, em nenhuma ocasião, o dízimo é mencionado em qualquer das instruções dadas à igreja”. Com base nessa observação, não se pode afirmar que essa prática foi ab-rogada no Cristianismo neotestamentário. Antes de tomar posição sobre esse
assunto, há que se analisar três assuntos diretamente relacionados no Novo Testamento: dízimo, dinheiro e contribuições religiosas.
Os evangelhos possuem três referências ao dízimo. A primeira
encontra-se na parábola do fariseu e o publicano, na qual o fariseu se orgulhava de entregar o dízimo de tudo quanto ganhava (Lc18.9-14). O propósito de Jesus foi o de condenar a atitude daqueles que “confiavam em si mesmos, por se considerarem justos, e desprezavam os outros” (v.9). O que foi condenado na parábola não foi a prática da entrega do dízimo, mas o fato do fariseu depender de sua justiça própria ao invés de apelar para a graça e misericórdia de Deus.
A segunda referência ao dízimo nos evangelhos encontra-se em Mateus 23.23 ou no texto paralelo de Lucas 11.42. Nesses versículos Jesus também faz referência a uma prática comum dos escribas e fariseus, que pareciam extremamente zelosos quanto à obediência dos aspectos mínimos da lei (dar o dízimo da arruda e do cominho), mas negligenciavam a prática da misericórdia, da justiça e da fé. Como afirma Boanerges Ribeiro, “Jesus não censura os fariseus por darem o dízimo, mas por julgarem que o dízimo substitui a base real das relações com Deus”. Jesus, a priori, condenou apenas a hipocrisia dos escribas e fariseus e não a prática da entrega dos dízimos.
Além das referências ao dízimo encontradas nos evangelhos, há a passagem de Hebreus 7.1-10. Há que se considerar que o escritor da carta aos Hebreus certamente não usaria o exemplo do dízimo se o mesmo não fosse uma prática conhecida por seus eleitores.
Certamente nem todas as vezes que Jesus falou sobre o dinheiro ele o fez em referência à contribuição. Exemplos  disso são encontrados em sua comparação do reino dos céus a um tesouro escondido no campo (Mt 13.44), na exposição sobre o    valor do evangelho (Mt 12.35), na parábola do administrador infiel (Lc 16.1-13) e outros textos. Mesmo assim, a atenção dada por Jesus à questão financeira foi notória: “vai da parábola do semeador à do rico proprietário, do encontro com o jovem rico ao encontro com Zaqueu, dos ensinamentos acerca da confiança de Mateus 6 aos ensinamentos acerca dos perigos das riquezas em Lucas 6”.14 Atentar para o ensino de Jesus sobre o dinheiro é especialmente elucidativo na reflexão sobre contribuições no Novo Testamento.
Para fins didáticos, a abordagem de Jesus sobre dinheiro pode
ser analisada a partir de suas observações sobre o uso negativo e positivo do mesmo. Com relação ao uso negativo do dinheiro, Jesus deixa claro que o apego às riquezas pode ser um grande empecilho à salvação (Mt 13.22 e Lc 18.24,25), bem como ao relacionamento do ser humano com Deus (Lc 12.15, 16.13 e Mt 6.19). A crítica de Jesus é veementemente dirigida contra a avareza.O dinheiro, na perspectiva de Jesus, deve ser servo e nunca senhor do cristão.
Parece ser suficiente afirmar que o apego ao dinheiro para
Jesus é uma idolatria que os cristãos devem evitar, a fim de crescerem em comunhão, intimidade e dependência ao Senhor.
Ainda que Jesus tenha advertido contra o perigo do apego ao
dinheiro, ele não impôs qualquer voto de pobreza como condição à vida cristã.
Qualquer coisa que leva o cristão a desejar a vida e o conforto terrenos mais do que a consumação do reino é nociva ao crescimento espiritual. Essa relação idólatra com o dinheiro parece ter sido uma das razões pelas quais Judas traiu Jesus, vendendo-o por trinta moedas de prata (Mt 26.15 e 27.3).
Jesus ensinou que o dinheiro pode ser utilizado positivamente.
Na parábola do bom samaritano ele ensinou que o dinheiro poderia ser usado para fazer o bem, pois o samaritano usou o dinheiro generosamente no cuidado do homem que ele encontrou ferido pelo caminho (Lc 10.25-37). Jesus ainda aprovou a decisão de Zaqueu em retribuir tudo o que havia defraudado e dar aos pobres a metade dos seus bens identificando-a como sinal de transformação na vida daquele publicano (Lc 19.1-10). Jesus também permitiu que ricas mulheres piedosas participassem do sustento de seu ministério (Lc 8.1-3) e comeu com pessoas ricas e privilegiadas (Lc 11.37). Outrossim, ele exortou os seus discípulos a darem esmolas (Mt 6.2-4). Quando empregados da maneira correta, os bens materiais e haveres podem ser instrumentos úteis para o auxílio ao próximo e o avanço da obra do reino.
Um exame detalhado da perspectiva de Jesus sobre o uso do
dinheiro não seria completo sem uma análise de sua reação a dois assuntos: o pagamento do tributo civil e a contribuição religiosa. Com relação ao primeiro, o evangelista Mateus relata que Jesus, ainda que alegando isenção, pagou o imposto civil a fim de evitar escândalo por parte dos judeus (Mt 17.24-27). Em outra ocasião, quando o interrogaram sobre a legalidade de se pagar tributo a César, Jesus prontamente respondeu: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Mt 22.15-22). Dessa forma, Jesus reprovou pelo exemplo qualquer ato de sonegação civil.
Sobre as contribuições religiosas, há que se observar o caso da viúva pobre. O evangelista Marcos registra que Jesus observava as pessoas lançarem o dinheiro no gazofilácio e elogiou a viúva pobre por seu desprendimento, pois “da sua pobreza deu tudo quanto possuía” (Mc 12.41-44). Deve-se notar que, naquele episódio, a contribuição foi tratada por Jesus como um assunto público a ponto de observar a atitude das pessoas ao fazê-lo. A contribuição da viúva pobre e dos outros judeus fazia parte da liturgia na sinagoga e esse fato não recebeu qualquer palavra de desaprovação por parte de Jesus. Ao contrário, ao aprovar a oferta daquela mulher, Jesus valorizou a oferta humilde e abnegada, exaltando-a acima da oferta do soberbo e daqueles que ofertavam apenas daquilo que lhes sobrava.
Pode-se inferir que o Senhor se agrada de que seus servos cumpram seus compromissos financeiros, tanto civis quanto religiosos. No que diz respeito a contribuições financeiras na igreja primitiva.
A escritura não permite nenhuma dúvida quanto às realizações
das mesmas. O livro de Atos contém alguns relatos sobre o
compartilhamento de posses com o objetivo de atender aos necessitados na igreja (At 2.45, 4.34 e 36,37).
A prática sistemática da contribuição financeira no Cristianismo primitivo que mais se aproxima da entrega do dízimo é aquela descrita como uma coleta a favor dos santos (1Co 16.1-3; 2Co 8-9).  É importante observar que alguns cristãos receberam a exortação de Paulo com alegria e interpretaram a contribuição como um privilégio (2Co 8.4). Aquela coleta foi incluída na liturgia da igreja de Corinto (1Co 16.1,2) e deveria ser interpretada como uma expressão de generosidade, gratidão e adoração a Deus (2Co 9.10-13).
Por essas e outras razões, o Novo Testamento ensina que as contribuições cristãs não devem se limitar, mas até exceder ao percentual estipulado pelo dízimo.              Portanto, na ausência de um mandamento explícito sobre o dízimo no Novo Testamento seria suficiente para considerar a sua prática como anticristã e legalista? O Novo Testamento esclarece que as ofertas dos cristãos deveriam ser praticadas à luz da encarnação de Cristo (2Co 8.9). Assim como Cristo deu-se plenamente pela redenção do seu povo, as ofertas dos seus discípulos devem ser inspiradas e motivadas pelo seu sacrifício.

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